Por várias vezes passei por essa praça reparando na diversidade do lugar. Pessoas descansando à sombra das árvores, no aconchego da igreja ou esperando o ônibus chegar ao terminal. Ambulantes vendendo milho verde, roupas, bonés e cd’s. Banca de revista e sapateiro tem de ruma. Os meninos jogam bila no canteiro, já os senhores, vão de dama.
Um dia, resolvi parar um pouco pra fotografar.
Animascópio
Neste ano tenho tido o prazer de trabalhar representando o 202B em um projeto chamado Animascópio. Uma iniciativa de Diego Akel e Carol Vieira, que convidaram 5 artistas visuais (Daniel Chastinet, Fernanda Meireles, Luci Sacoleira, Narcélio Grud e Saulo Tiago) residentes em Fortaleza – CE para participarem de um laboratório de criação.
A proposta é incluir procedimentos do cinema de animação nos nossos trabalhos, oferecendo acompanhamento e tutoria. Experimentando diferentes maneiras, de acordo com nossas linhas de pesquisa, ampliando as possibilidades dos nossos processos de criação. A priori, cada um de nós construirá um pequeno filme como resultado dos nossos experimentos no laboratório. O nascimento do projeto vem da vontade dos idealizadores em difundir a produção do cinema de animação experimental na cidade, estabelecendo interseções com trabalhos de artistas que apontam possíveis vínculos com esta linguagem.
Para a criação do meu curta, estou tendo a oportunidade de trabalhar em parceria com o Clayton Bochecha, idealizador do Bochecha Estúdio. Produzimos também nos espaços do NUCA – Núcleo de Cinema de Animação, que Funciona na Casa Amarela Eusélio de Oliveira, onde trabalha um bocado de gente boa.
Texto: Saulo Tiago
[VÍDEO] No barco
Esse vídeo foi filmado numa viagem de barco de Belém a Manaus. São cinco dias de viagem rio acima. Percorremos 1.600km passando por onze cidades para abastecer o barco com vários produtos a serem levados até Manaus. O barco não é preparado para turismo. É o transporte semanal das pessoas que moram em cidades à beira do Rio Amazonas. Então, durante esses cinco dias convivi com “o pessoal de lá” dormindo em redes apertadas e comendo quentinhas caseiras de carne ou frango.
Entre o que mais me chamou atenção na viagem estão as crianças ribeirinhas. Meninos e meninas e o seu trabalho. De certa forma um trabalho que se transforma em brincadeira e intercâmbio cultural para estas crianças que moram ali à beira do Amazonas. Os jovens habitantes das margens do Rio, em pequenas canoas, remam até o barco pra vender frutas, camarões, vegetais e outros produtos “da terra” para a tripulação do barco. Com uma parte do dinheiro da venda compram um pouco do sabor do “mundo de fora” (chiclete, biscoito, coca cola) e com olhares, conversas com pessoal da cidade, instigam a curiosidade. O que estes meninos tiram do trabalho? O que este trabalho tira deles? No barco, os meninos observam de onde normalmente eles são observados. E me pergunto, o que será que esses meninos pensam de si próprios ao observar “o seu lugar”. Não deu para responder no dia… Fico com a pergunta na cabeça. Quem sabe um dia eu volte lá pra descobrir.
As filmagens aleatórias feitas durante a viagem possibilitaram-me organizar este vídeo. São imagens comoventes que me ajudarão a lembrar e contar um pouco do que vi nesta viagem. Na verdade, um pouco da minha viagem na viagem.
